Um dos maiores historiadores do Brasil, Boris Fausto morreu nesta terça-feira (18), em São Paulo, aos 92 anos. O velório será na Funeral Home, na região da Avenida Paulista, a partir de 8h de quarta-feira (19).
Seu primeiro livro, “A Revolução de 1930 – historiografia e história”, propôs uma interpretação nova a respeito das classes sociais e das forças armadas no Brasil. Publicado pela primeira vez em 1969, é considerado um clássico das ciências sociais brasileiras.
Como foi lançado pouco depois do AI-5, durante a ditadura militar, um editor chegou a achar arriscado publicar. “Ele disse ‘olha, do jeito que está o clima, não posso me arriscar a publicar esse livro”, contou o historiador em documentário sobre ele lançado em 2018.
Autor de mais de 30 livros, incluindo grandes sucessos literários como “O Brilho do Bronze” e “O Crime do Restaurante Chinês”, Boris tinha um olhar cuidadoso sobre os capítulos recentes do Brasil.
No documentário “Boris Fausto”, o historiador disse acreditar que o Brasil “tem jeito”.
“Depende de uma categoria complicada que são os brasileiros… os brasileiros políticos, os brasileiros da elite, os brasileiros do povo, os brasileiros da direita, os brasileiros da esquerda radical”.
“O funcionamento da democracia no Brasil se precarizou muito, mas eu continuo achando que o regime democrático é fundamental”, disse.
Ele também falou sobre “história” e “memória” no documentário ao comentar sobre o filme “Amnésia”.
“Eu vi um filme, o Amnésia que tinha um personagem que só lembrava do que imediatamente aconteceu e ele era manipulado de todo jeito então acho que radicalizando na ficção o que pode haver é um desinteresse, uma desvalorização da História o que é uma forma de amnésia”.
Maria Aparecida Aquino, professora de História da USP, diz que Boris era um dos maiores historiadores do Brasil: “Se não o maior”. Suas lembranças com Boris vão de debates em frente às câmeras a bancas de trabalhos acadêmicos.
“Muito gentil, um cavalheiro. Uma pessoa muito importante. Nós vamos sentir muita falta dele. Ele deu essa dimensão nova sobre a República. Todos nós ficamos mais pobres com sua ausência.”
Aquino considera o período da sua pesquisa que cobre a revolução de 30 a mais importante. “É a que gosto mais pela compreensão ampla da República. “Temos uma dívida com ele por isso”.
“Bom ou ruim, eu sou mais escritor”
Em entrevistas, Boris explicava que a escolha pelo crime como gênero literário era um caminho para adentrar à chamada microhistória, abordada inicialmente pelo historiador francês Emmanuel Le Roy Ladurie. É onde, por exemplo, “ O crime do restaurante chinês” se enquadra.
Entre o romance policial e a história do Brasil, ele narra um dos acontecimentos policiais que mais mobilizaram a opinião pública paulistana. Boris era um menino quando, depois do carnaval de rua, um homem negro foi acusado de matar o ex-patrão chinês e mais três pessoas com golpes de pilão. Ocorrido em 1938, o crime é o mote para abordar a relação entre migrantes, imigrantes e trabalhadores marginalizados numa São Paulo de intensas transformações socioeconômicas e culturais.
Boris também escreveu Crime e Cotidiano. A Criminalidade em São Paulo. Os trabalhos sobre crime e criminalidade foram premiados pela American Sociological Association em 1999.
“(Por que crimes ficam na memória coletiva?) São as coisas que impressionam muito as pessoas. Tem um impacto muito grande. Passam de pai pra filho. Mãe pra filha. Mas há também crimes que desaparecem e você precisa desenterrar porque eles são muito interessantes”, disse em entrevista ao Programa do Bial.
Último livro
Em março de 2020, começo da pandemia, Boris conversou com seu filho, o sociólogo Sergio Fausto, e a jornalista Renata Lo Prete, em um episódio do podcast “O Assunto”. Pai e filho contaram como faziam para matar a saudade, a rotina em quarentena e os planos para quando tudo voltasse à normalidade.
Em 2021, Boris publicou “Vida, morte e outros detalhes”. O livro nasceu a partir de um acontecimento pessoal: a morte do seu irmão Ruy Fausto no início da pandemia. A obra traz um conjunto de memórias e reflexões sobre relações familiares, as rivalidades do afeto, o envelhecimento e a finitude.
“Da minha parte, a pandemia fez reviver o passado, que se tornou uma presença cotidiana, e me aproximou, ainda mais, de meu irmão Ruy pela via do divertimento. Sua morte inesperada e essa aproximação me impulsionaram a escrever este livro, passo a passo, sem um esquema prévio”, escreveu Boris Fausto no início do livro.
Resultado do luto íntimo e pelo Brasil durante a pandemia de Covid-19, o livro divide-se em três partes. Na segunda e na terceira partes, uma série de vinhetas compõe um mosaico sobre a fugacidade da vida e a fragilidade dos afetos.
Em junho de 2021, Boris teve um AVC, mas sua recuperação foi considerada satisfatória. Sobre a morte, Boris costumava reproduzir uma citação de Elias Canetti, romancista e ensaísta de nacionalidade búlgara e britânica.
“Eu odeio a morte. Vou lutar até o fim contra ela, embora eu saiba que vou perder”.
Biografia
Filho de imigrantes judeus, Boris Fausto nasceu em São Paulo, no dia 8 de dezembro de 1930. Primeiramente, formou-se bacharel em Direito pela Universidade de São Paulo, em 1953. Depois, em 1966, gradou-se em História pela mesma faculdade, onde se tornou doutor em 1969. Foi professor no Departamento de Ciência Política da USP e colunista semanal do jornal “Folha de São Paulo”. Também integrou a Academia Brasileira de Ciências.
Fonte: G1
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