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STF avança com 3 a 0 contra o marco temporal indígena

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O Supremo Tribunal Federal (STF) registrou um placar de 3 votos a 0 contra a constitucionalidade do marco temporal para a demarcação de terras indígenas, em mais um capítulo de um dos julgamentos mais aguardados e complexos da história recente do país. A tese do marco temporal, que restringe o direito dos povos originários à posse de terras que já ocupavam na data da promulgação da Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988, ou que estavam em disputa judicial nessa época, volta a ser tema de intensa discussão. Os ministros Gilmar Mendes, relator do caso, Flavio Dino e Cristiano Zanin já proferiram seus votos pela inconstitucionalidade da medida, consolidando uma posição inicial contrária à restrição. Este cenário reacende o debate sobre os direitos territoriais indígenas e a interpretação constitucional.

O julgamento e o placar atual

O julgamento sobre a validade do marco temporal é um dos mais significativos para os povos indígenas do Brasil, com repercussões diretas sobre a posse de suas terras tradicionais. A sessão, que ocorre no plenário virtual da Corte, iniciou-se recentemente e ficará aberta para a manifestação dos ministros até a noite de quinta-feira, dia 18, às 23h59. A fase atual do processo vê a formação de um placar favorável aos direitos indígenas, com três votos já registrados contra a tese restritiva.

O ministro Gilmar Mendes, na posição de relator da ação, foi o primeiro a se manifestar, votando contra o marco temporal. Em seu entendimento, a tese é incompatível com os direitos originários dos povos indígenas, reconhecidos pela Constituição de 1988. Mendes enfatizou a importância de uma interpretação que garanta a proteção desses direitos, que precedem a própria formação do Estado brasileiro. Na sequência, o ministro Flavio Dino corroborou o posicionamento do relator, destacando a necessidade de se considerar a realidade histórica e as constantes violações sofridas pelas comunidades indígenas ao longo do tempo. Seu voto reforçou a ideia de que a Constituição não pode ser lida de forma a anular direitos fundamentais. Mais recentemente, o ministro Cristiano Zanin adicionou seu voto ao placar, solidificando a maioria inicial de três a zero contra a tese. A votação prossegue, e a expectativa agora se volta para os sete ministros restantes que ainda precisam proferir seus votos, crucial para a definição do resultado final.

A tese do marco temporal em questão

A tese do marco temporal propõe que os povos indígenas teriam direito apenas às terras que estavam sob sua posse em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal. Alternativamente, seriam consideradas as terras que, nessa mesma data, estivessem em comprovada disputa judicial ou físico-comprovada. Essa interpretação legal defende que, se não houvesse ocupação ou disputa territorial na referida data, os indígenas perderiam o direito de reivindicar a demarcação daquela terra como tradicional.

Os defensores do marco temporal, em grande parte representantes do setor agropecuário e parlamentares da bancada ruralista, argumentam que a fixação de uma data limite traria segurança jurídica às propriedades rurais e evitaria a revisão de demarcações já estabelecidas ou a abertura de novas disputas em áreas consolidadas. Eles alegam que a ausência de um “marco” geraria instabilidade e incerteza sobre o direito à propriedade.

Por outro lado, as entidades indígenas, organizações de direitos humanos e juristas críticos à tese sustentam que o marco temporal é inconstitucional e violaria os direitos originários dos povos indígenas. Argumentam que a Constituição reconhece esses direitos como preexistentes, ou seja, anteriores à própria Carta Magna, e que muitas comunidades foram historicamente expulsas de suas terras à força ou por coerção, o que as impediria de comprovar a posse na data específica de 1988. Além disso, destacam que a demarcação de terras indígenas não se limita à posse física, mas abrange aspectos culturais, históricos e de subsistência, essenciais para a manutenção de suas identidades e modos de vida. Para eles, a tese legitima injustiças históricas e abre precedentes perigosos para a desocupação de territórios ancestrais, ignorando o caráter coletivo e contínuo da ocupação indígena.

Histórico de um embate legislativo e judicial

A discussão sobre o marco temporal não é recente e tem sido palco de um longo embate entre o poder Judiciário e o Legislativo, além de intensa mobilização social. Em 2023, o próprio Supremo Tribunal Federal já havia se manifestado sobre o tema, declarando a inconstitucionalidade do marco temporal. Essa decisão, que na época representou uma importante vitória para os povos indígenas, não encerrou a controvérsia, que continuou a se desenrolar em outras esferas políticas.

Paralelamente à atuação do STF, o Congresso Nacional também se debruçou sobre a questão. Uma das iniciativas legislativas mais notórias foi a Lei 14.701/2023, que buscava validar a tese do marco temporal. Contudo, partes dessa lei foram vetadas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que se posicionou contra a restrição dos direitos territoriais indígenas. O veto presidencial, porém, foi posteriormente derrubado pelos parlamentares, fazendo com que a Lei 14.701/2023 prevalecesse novamente com a tese do marco temporal incluída. Essa sequência de eventos – decisão do STF pela inconstitucionalidade, veto presidencial e derrubada do veto pelo Congresso – evidencia a complexidade do tema e a divergência de entendimentos entre os poderes.

Após a derrubada do veto, partidos políticos como o PL, o PP e o Republicanos, que apoiam a tese do marco temporal, protocolaram ações no STF buscando manter a validade da legislação aprovada pelo Congresso. Em contrapartida, entidades representativas dos povos indígenas, partidos governistas e organizações de direitos humanos também recorreram ao Supremo, contestando novamente a constitucionalidade da tese e pedindo que a Corte reafirme sua posição anterior pela inconstitucionalidade. Este vaivém judicial e legislativo demonstra a natureza intrinsecamente política e ideológica da questão, com cada lado buscando salvaguardar seus interesses e visões de mundo.

A PEC 48/23 e o papel do senado

Em paralelo ao julgamento no Supremo Tribunal Federal, o Senado Federal também tem desempenhado um papel crucial na discussão do marco temporal, atuando em uma frente legislativa que busca constitucionalizar a tese. Na semana passada, o Senado aprovou a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 48/23, um movimento que visa inserir o marco temporal diretamente na Carta Magna.

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A PEC 48/23 propõe uma alteração na Constituição para estabelecer que as terras indígenas seriam aquelas ocupadas pelos povos originários em 5 de outubro de 1988, ou as que estivessem em comprovada disputa judicial ou física nessa data. Se aprovada em todas as instâncias legislativas e promulgada, essa emenda teria o poder de sobrepor-se a qualquer decisão judicial que declare a inconstitucionalidade do marco temporal, uma vez que a tese passaria a ter status constitucional.

Essa iniciativa do Senado é vista por muitos como uma tentativa de “blindar” a tese do marco temporal contra futuras decisões do STF, garantindo sua validade por meio da máxima hierarquia normativa. Para os povos indígenas e seus apoiadores, a aprovação da PEC representa uma grave ameaça aos seus direitos e um retrocesso histórico, pois institucionalizaria a restrição territorial e potencialmente abriria caminho para a perda de terras já demarcadas ou em processo de demarcação. Por outro lado, defensores da PEC argumentam que ela traria a segurança jurídica tão almejada, evitando que o Judiciário reexamine indefinidamente as demarcações de terras e pondo fim à incerteza sobre a propriedade fundiária. O avanço da PEC no Senado, enquanto o STF ainda delibera, ressalta a tensão e o conflito de poderes na definição de uma questão tão sensível e de impacto duradouro para o futuro do Brasil.

Conclusão

O julgamento do marco temporal no Supremo Tribunal Federal representa um momento decisivo para os direitos dos povos indígenas e para a própria interpretação da Constituição Federal brasileira. Com um placar inicial de 3 a 0 contra a tese restritiva, a Corte sinaliza um entendimento alinhado com a proteção dos direitos originários, mas o desfecho final ainda depende dos votos restantes. A complexidade do tema é acentuada pelo embate contínuo entre os poderes Judiciário e Legislativo, bem como pela forte mobilização de diferentes setores da sociedade civil. A decisão do STF terá um impacto profundo na vida de milhões de indígenas, na demarcação de suas terras e na preservação de suas culturas, ecoando por gerações.

FAQ

O que é o marco temporal para demarcação de terras indígenas?
É uma tese jurídica que defende que os povos indígenas só teriam direito às terras que estavam sob sua posse em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal, ou que estivessem em disputa judicial ou física comprovada nessa data.

Qual é a situação atual do julgamento do marco temporal no STF?
Atualmente, o julgamento no plenário virtual do STF tem um placar de 3 votos a 0 contra a tese do marco temporal. Os ministros Gilmar Mendes (relator), Flavio Dino e Cristiano Zanin votaram pela inconstitucionalidade da medida. A votação continua aberta até quinta-feira (18), às 23h59, com sete votos ainda a serem proferidos.

Por que o marco temporal é tão controverso?
A tese é controversa porque, para os povos indígenas e seus defensores, ela ignora o caráter originário de seus direitos territoriais e as históricas expulsões e violências sofridas. Argumentam que muitas comunidades foram removidas de suas terras antes de 1988 e não teriam como comprovar a posse na data estabelecida, o que resultaria na perda de seus direitos e na inviabilização de sua subsistência e cultura.

Qual o papel do Congresso Nacional nessa discussão?
O Congresso Nacional tem atuado em paralelo ao STF. Parlamentares aprovaram a Lei 14.701/2023, que validava a tese do marco temporal, derrubando inclusive um veto presidencial. Além disso, o Senado aprovou a PEC 48/23, que busca inserir o marco temporal diretamente na Constituição, o que, se aprovado, teria o poder de sobrepor-se a decisões judiciais contrárias à tese.

Mantenha-se informado sobre os desdobramentos deste julgamento crucial para o futuro dos povos indígenas e do Brasil, acompanhando as próximas atualizações da Corte.

Fonte: https://agenciabrasil.ebc.com.br

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