© Salomão Scliar/ Cinemateca Capitólio

Vento Norte: o Primeiro longa gaúcho com som brilha em Roterdã

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O cinema brasileiro alcança um novo marco histórico com a seleção de Vento Norte (1951) para a próxima edição do Festival Internacional de Cinema de Roterdã (IFFR), um dos cinco maiores eventos do gênero na Europa. Programado para acontecer entre 29 de janeiro e 8 de fevereiro de 2026 na Holanda, o festival exibirá o primeiro longa-metragem de ficção sonora realizado integralmente no Rio Grande do Sul na prestigiada mostra “Cinema Regained”, dedicada a obras clássicas restauradas. A inclusão de Vento Norte, após um meticuloso processo de restauração em 4K, não apenas resgata uma peça fundamental da cinematografia gaúcha, mas também oferece uma vitrine global para a riqueza e a diversidade da produção nacional, projetando a obra de Salomão Scliar para um público internacional exigente e engajado com a cultura cinematográfica de arquivo.

Resgate histórico: a restauração de Vento Norte

A seleção de Vento Norte pelo Festival de Roterdã é o coroamento de um intenso trabalho de resgate e preservação. O filme, lançado em 1951, foi submetido a uma restauração completa em formato 4K, um padrão de altíssima resolução que atende às exigências das projeções digitais modernas. Esse esforço foi conduzido pela Cinemateca Capitólio, de Porto Alegre, em colaboração estratégica com a Cinemateca Brasileira, de São Paulo, e contou com o apoio da Secretaria Municipal de Cultura da capital gaúcha. O projeto estava no radar dos preservacionistas há décadas, e sua conclusão coincidiu com o centenário de nascimento de Salomão Scliar, o cineasta por trás da obra, adicionando uma camada extra de significado à iniciativa.

A importância da preservação cinematográfica

A diretora da Cinemateca Capitólio, Daniela Mazzilli, sublinhou a relevância histórica do longa-metragem. “Por ser o primeiro filme de ficção sonora realizado inteiramente no estado do Rio Grande do Sul, um dos principais objetivos era conseguir recuperar essa cinematografia gaúcha”, explicou. A necessidade da restauração se tornou premente devido à deterioração das cópias físicas existentes. O filme possuía apenas duas cópias em 35 milímetros, uma delas no Rio Grande do Sul, o que representava um risco considerável para sua projeção e preservação a longo prazo. As digitalizações em formatos mais antigos, como VHS feitas nos anos 1990, já não são compatíveis com a alta definição das projeções atuais. A restauração em 4K, que incluiu a recuperação do som original, assegura não apenas a sobrevivência da obra, mas também sua circulação em condições ideais, transformando as cópias em película em “cópias de guarda” e priorizando a versão digital para difusão. A possibilidade da existência de uma terceira cópia no Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA) está sendo investigada, o que poderia enriquecer ainda mais o acervo.

O legado de Vento Norte e seu criador

Vento Norte transcende sua importância histórica por sua estética e narrativa. Filmado em preto e branco na cidade de Torres, no litoral gaúcho, o filme se destaca pela beleza de sua fotografia e pela originalidade de sua abordagem. Esteticamente, a obra de Scliar é vista como um elo crucial entre o neorrealismo italiano e o cinema novo brasileiro. Essa conexão se manifesta na linguagem cinematográfica empregada, na utilização de não-atores para compor grande parte do elenco — muitos dos pescadores de Torres atuaram no filme — e na exploração das paisagens naturais como elementos narrativos.

Uma obra esteticamente relevante e seu enredo

A trama de Vento Norte desdobra-se em uma pequena vila de pescadores, cuja rotina é abruptamente alterada pela chegada de um enigmático forasteiro. Sua presença deflagra paixões intensas e uma sequência de atos violentos entre os moradores locais, culminando em um desfecho trágico. Além do drama humano, o filme oferece um panorama inédito das dunas e dos ventos do litoral gaúcho, uma paisagem pouco explorada no imaginário nacional, que geralmente associa o Rio Grande do Sul a cenários serranos ou campestres. Essa representação de uma cultura litorânea própria, com seus pescadores e suas tradições, ressalta a diversidade geográfica e cultural do Brasil. O filme foi montado no Rio de Janeiro e teve sua primeira exibição no Círculo de Estudos Cinematográficos em janeiro de 1951. Mais recentemente, em maio de 2023, teve sessões no Museu de Arte de São Paulo (MASP) e no Clube de Cinema de Porto Alegre, além de ter sido exibido no Cinema Imperial, na capital gaúcha, em julho do mesmo ano.

Salomão Scliar: o cineasta e fotógrafo pioneiro

Salomão Scliar (1925-1991), o diretor de Vento Norte, foi um fotógrafo de renome, com passagens pelos principais veículos de comunicação do país. Contudo, sua incursão na direção de longas-metragens foi singular: Vento Norte é seu único filme de ficção. A diretora Daniela Mazzilli observa que Scliar, por essência, dedicou-se predominantemente à fotografia, o que o tornou menos conhecido pelas novas gerações de cineastas e estudantes de cinema no Brasil, apesar de sua obra ser amplamente estudada no Rio Grande do Sul devido ao seu caráter pioneiro. A pesquisa aprofundada de Glênio Póvoas sobre o filme foi fundamental para guiar o processo de restauração. Espera-se que a exibição de Vento Norte em Roterdã inspire novas gerações, dada a forte conexão da obra com o cinema novo brasileiro e figuras como Glauber Rocha, uma ligação perceptível inclusive no trailer do filme.

Projeção internacional e o futuro do cinema de arquivo

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A participação de Vento Norte no Festival de Roterdã é descrita pela equipe da Cinemateca Capitólio como uma “experiência surreal”. O processo de seleção foi longo e rigoroso, envolvendo meses de curadoria e avaliação por uma equipe especializada do festival. Roterdã, que anualmente avalia quase 400 filmes em suas diversas mostras, é conhecido por seu alto padrão e seu funil de seleção extremamente apertado. No ano anterior, 43 filmes de arquivo concorreram a uma vaga, e Vento Norte será o único filme brasileiro selecionado para a mostra “Cinema Regained”.

Essa projeção global de Vento Norte representa a primeira exibição mundial de sua versão restaurada em um grande festival, o que tem o potencial de abrir portas para convites de outros eventos de prestígio que valorizam o cinema de arquivo, como os festivais de Berlim, Cannes, Veneza e Locarno. A oportunidade de apresentar um filme até então pouco conhecido internacionalmente, que resgata uma cinematografia regional e a coloca em diálogo com movimentos artísticos globais, é um presente para o cinema gaúcho e para o Brasil. É um testemunho da importância de preservar e difundir o patrimônio audiovisual, revelando a grandeza e a diversidade da produção nacional ao redor do mundo.

Perguntas frequentes sobre Vento Norte e o festival

O que é Vento Norte e qual sua importância histórica?
Vento Norte é um longa-metragem de ficção de 1951, dirigido por Salomão Scliar. Sua importância reside em ser o primeiro filme sonoro de ficção realizado inteiramente no Rio Grande do Sul, marcando um ponto de virada na cinematografia gaúcha.

Como foi realizada a restauração do filme?
A restauração foi feita em 4K pela Cinemateca Capitólio, em parceria com a Cinemateca Brasileira e a Secretaria Municipal de Cultura de Porto Alegre. O processo incluiu a recuperação de imagens e som a partir das cópias originais em película.

Quando e onde Vento Norte será exibido no Festival de Roterdã?
O filme será exibido em duas sessões durante o Festival Internacional de Cinema de Roterdã (IFFR), na Holanda, que ocorrerá de 29 de janeiro a 8 de fevereiro de 2026. As datas exatas ainda serão divulgadas.

Qual o significado da participação de Vento Norte para o cinema brasileiro?
A seleção de Vento Norte para um festival de prestígio como Roterdã significa reconhecimento internacional para uma obra pioneira, abre portas para a exibição em outros festivais e destaca a importância da preservação do cinema de arquivo nacional.

Explore a riqueza do cinema brasileiro e fique atento às próximas exibições de Vento Norte, uma obra que atravessa décadas para inspirar novas gerações e celebrar a diversidade cultural do país.

Fonte: https://agenciabrasil.ebc.com.br

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